ALMEIDA, Rute Salviano, PINHEIRO, Jaqueline Sousa. Reformadoras: mulheres que influenciaram a reforma e ajudaram a mudar a igreja e o mundo. Rio de Janeiro: GodBooks; Thomas Nelson Brasil, 2021. (236 páginas).
No texto em epígrafe há expressa preocupação para apresentar o resultado de importante pesquisa realizada pelas autoras a respeito da marcante presença e atuação de mulheres no movimento da Reforma Protestante ocorrida no século XVI.
A presença feminina está representada pela seleção de 13 mulheres que compreenderam e defenderam a fé cristã do ponto de vista dos reformadores que contestavam práticas religiosas da igreja incoerentes com os ensinamentos do Evangelho, principalmente quanto ao comércio paras se obter a garantia da salvação.
O livro se organiza em 4 temas e em cada um são mencionadas mulheres que se destacaram para defender propostas que retomavam o estudo das Escrituras como fundamento para a vida cristã.
Mulheres que sofreram perseguição e morte por se tornarem hospitaleiras ao acolherem pessoas adeptas à reforma; ao publicarem textos denunciando os desvios da igreja; ao se tornarem líderes, teólogas e pregadoras. Enfatizavam que somente a fé em Jesus era a garantia da vida eterna com Deus e para isso não havia esforço humano, poder ou riqueza que pudessem perdoar e reaproximar o ser humano do Criador.
Os dois primeiros temas apresentam mulheres que marcaram a história da Reforma Protestante como escritoras apologetas e mulheres nobres que ocupando o poder contribuíram para a expansão das propostas dos reformadores.
Algumas foram teólogas, escritoras que não se calaram, ainda que criticadas e desqualificadas. Dentre elas Argula von Grumbach que foi reconhecida, pelo reformador Lutero, por sua “potencialidade teológica, fé e coragem”. Ela é considerada a primeira mulher a publicar panfletos defendendo as ideias reformadas, os quais se tornaram best-sellers nos tempos da Reforma. Ao lado de Argula, pode-se mencionar Maria Dentière que após aprender sobre a doutrina dos reformadores “levantou bandeira em defesa da mulher protestante no ministério da pregação pública”. Por defender a participação das mulheres na escrita e na teologia, suas publicações foram proibidas, confiscadas pelo governo em Genebra e o conselho local proibiu a “publicação de qualquer outra autora na cidade pelo resto do século 16”. Ainda, Olympia Morata, morreu jovem, mas foi considerada a mulher mais culta da Europa, por frequentar a academia, onde apresentava preleções com excelente desempenho. Suas publicações eram compostas por cartas, diálogos, poemas e tradução de vários Salmos, usada pelos reformadores por ser considerada de qualidade.
Como mulheres nobres que deram importante contribuição para que a reforma se espalhasse pelos países europeus é mencionada pelas autoras a rainha da França, Margarida de Navarra, erudita teóloga que afetuosa e corajosamente difundia o evangelho. Renata, duquesa, protegia os que aderiam à Reforma e eram perseguidos pelo rei e pela igreja católica, e ainda Joana IV de Navarra que fundou em seu reino a igreja reformada na província de Béarn e foi considerada inimiga pela Contrarreforma.
Os dois últimos temas apresentam as mulheres de alguns reformadores e rainhas e mártires que morreram na Inglaterra por defenderem a fé cristã na perspectiva reformada.
Catarina Zell, esposa de Mateus Zell, Catarina von Bora, esposa de Martinho Lutero e Idelette de Bure, esposa de João Calvino, são mencionadas como mulheres que contribuíram para que o movimento da Reforma se mantivesse e crescesse, embora muito pouco sejam lembradas como mulheres corajosas e destemidas que se mantiveram firmes ao lado dos reformadores e colaborando com ideias e trabalho.
Catarina Zell foi perseguida pelos líderes luteranos acusada de querer tomar o lugar do marido, pastor luterano Mateus Zell. Ela escreveu em defesa do casamento dos padres apresentando razões práticas e teológicas, no entanto, seus escritos foram proibidos pela Câmara Municipal de Estrasburgo. Cuidava dos doentes e necessitados e criticava o poder dos líderes da igreja. Pregou no velório do esposo, somente para as pessoas mais íntimas, em defesa da paz. Pregou mais duas vezes, em sepultamento de mulheres, pois os pastores se recusaram a fazer o ofício fúnebre, por serem anabatistas.
Catarina von Bora é uma das reformadoras omitida pela história. Cuidava da propriedade em que vivia com Lutero e os filhos, administrava as finanças, acolhia pessoas que estudavam com seu esposo; por gostar de ler era incentivada por Lutero para dirigir estudos bíblicos devocionais e participava das discussões teológicas em sua casa.
Calvino foi casado com Idelette de Bure que foi sua companheira por 10 anos e cuidou do reformador que tinha a saúde frágil. Hospitaleira, cuidava dos refugiados, dos necessitados como prática da mensagem do Evangelho e colaborou para que a Reforma não se resumisse em ideias e tratados, mas ocorresse no cotidiano com pessoas que precisavam conhecer o amor de Deus e pela fé, reconheciam a justificação proporcionada pela morte e ressurreição de Jesus.
E, por fim, rainhas e mártires na Inglaterra. Rainha Catarina Parr, esposa de Henrique VIII, se dedicava ao estudo da Bíblia, além de escrever obras como Orações e meditações e Lamentações de uma pecadora, quando criticou os clérigos ingleses por não terem Cristo como centro da existência e por não serem exemplo para os fiéis. A sua importância para a Reforma, além das publicações, foi ter mantido o Salão Protestante onde mulheres se reuniam para estudar as doutrinas bíblicas.
São mencionadas também as contribuições de Anne Askew e de Jane Grey.
Anne Askew, ao lado da rainha Catarina defendeu a fé cristã reformada. Não se calava quando havia debates públicos e foi presa como herege. Ela foi torturada na torre de Londres para desistir da fé e entregar as mulheres da nobreza que, com ela, faziam parte da nova “seita”. Anne foi executada por não abandonar a fé e não se sujeitar às autoridades religiosas que se desviaram dos ensinamentos das Escrituras. As torturas e perseguições que foi alvo estão registradas no livro Confissões de Anne, de John Bale.
Jane Grey foi condenada à morte por defender a fé cristã reformada. Na prisão ao ser visitada pelo capelão para se retratar não renunciou os ensinamentos das Escrituras em relação à fé e aos sacramentos. A sua recusa em declarar a necessidade de obras para a salvação e de aceitar a doutrina da transubstanciação defendida pela igreja católica, foram decisivos para que se mantivesse a sua execução.
NO livro, além de detalhes a respeito da vida das mulheres mencionadas, da perseverança, da coragem e da ousadia, pode-se encontrar parte da história do movimento da Reforma desconhecida com a participação e efetiva colaboração de mulheres que deram a própria vida para que a fé cristã a partir do século XVI alcançasse outros povos em todos os continentes.
Para que o período da Reforma não seja conhecido apenas a partir dos expoentes masculinos, esta é importante obra para a inclusão de mulheres que também fazem parte dessa história.
Revda. Shirley Maria dos Santos Proença
Professora da FATIPI
Pastora da 3ª. IPI de Guarulhos/SP
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