Somos uma sociedade tecnológica. O avanço das novas TICs é bem vinda e traz consigo muitas oportunidades e vários desafios éticos e teológicos para a igreja. Tecnologias da informação e comunicação (TIC) é uma expressão que se relaciona ao papel da comunicação na moderna tecnologia da informação. TICs são todos os meios (equipamentos e programas) usados para tratar a informação e auxiliar na comunicação. Os historiadores chamam de “a quarta revolução industrial”. A primeira revolução foi a produção mecânica(sécs XVII e XVIII), a segunda veio com a descoberta da eletricidade(séc. XIX e XX), no início da década de 60, a terceira revolução com o advento da internet e agora a tecnologia e o digital, como a quarta revolução.
O uso das mídias digitais propicia à educação teológica e à igreja chegarem a todos os lugares. Vídeos no YouTube, instagram, Tik Tok, podcasts e outros recursos tecnológicos facilitam a comunicação e aumentam o nosso alcance. Um desses recursos é a IA – Inteligência Artificial, que ainda é algo que nos desafia e precisamos nos preparar melhor para fazer uso dessa tecnologia. Através dela temos hoje o ChatGPT, o metaverso, que está ganhando cada vez mais espaço no Brasil, e pode ser uma ferramenta pedagógica importante quando tivermos condições de dominar essa tecnologia. O Metaverso é um mundo virtual onde as pessoas, através de seus avatares, podem interagir umas com as outras em vários lugares do mundo e em tempo real. Isso já é uma realidade, especialmente no mundo dos games online. Na área da aprendizagem, o metaverso abre muitas possibilidades. Imaginem um aluno/a de grego ou filosofia podendo conhecer a Grécia antiga. O professor de Antigo Testamento apresentando aos alunos/as o templo de Salomão. O professor de história da igreja levando os alunos/as para caminhar nas ruas da Roma antiga, nos mosteiros medievais, na igreja de São Pedro em Genebra onde Calvino pregou tantas vezes. As possibilidades são imensas. Embora, o que expus acima demore um tempo para se tornar realidade para todos/as, é necessário desenvolver uma política cognitiva de educação. É preciso compreender que não se trata de substituição, ou seja, de simplesmente trocar uma metodologia por outra, mas de coexistência.
Mas, ao mesmo tempo que nos oferece várias oportunidades, traz no seu bojo uma série de desafios éticos e teológicos tanto para a educação teológica como para a igreja.
Álvaro Machado[1], em seu artigo no portal UOL, falando da inserção da tecnologia no mundo da religião, escreveu: “Fiéis gerarão analytics. Analytics gerarão expectativas de conversão. Estas por sua vez guiarão a indústria de vestíveis[1], aplicativos e algoritmos, sob os princípios da economia de escala. O broadcasting religioso abandonará o modelo Edir Macedo e adotará o modelo Jeff Bezos. Dízimos farão parte da economia das assinaturas. Vestíveis e celulares com programas doutrinários servirão de prêmio e de brinde. Expressões como assistente de Deus, pastor digital, missa assíncrona, preach-to-text (PtT) e preach-to-voice (PtV) serão inventadas e irão se tornar corriqueiras. Muita coisa vai mudar. E muita gente não vai perceber”.
No Observatório Evangélico, blog do Dr. Juliano Spyer, artigo do dia 30/09/2023, como o título: “Coreanos simpatizam com a ideia de pastor de Inteligência Artificial”, escreveu que “A adoção da tecnologia ChatGPT por cristãos na Coreia do Sul, está gerando controvérsias no contexto em que o cristianismo é a principal religião. Startups locais estão desenvolvendo aplicativos que usam IA generativa para estudos bíblicos e serviços de oração. A polêmica em torno do uso da IA em contextos religiosos está relacionada à sua capacidade de replicar aspectos da espiritualidade e da religião, bem como às preocupações sobre sua precisão, autenticidade e impacto nas práticas religiosas tradicionais”. O artigo traz críticas quanto ao uso indiscriminado da tecnologia no desenvolvimento de uma espiritualidade sadia, mencionando alguns aspectos importantes: Autenticidade Espiritual: Alguns argumentam que a espiritualidade e a religião são experiências profundamente pessoais e espirituais, e a introdução da IA nesses aspectos pode parecer inautêntica e artificial. Há preocupações de que a IA possa comprometer a autenticidade da experiência religiosa. Possibilidade de Erros: A IA não é perfeita e pode cometer erros, inclusive na interpretação de textos religiosos. Isso pode levar à disseminação de informações incorretas ou interpretações religiosas distorcidas, o que é particularmente problemático em contextos religiosos. Substituição de Líderes Religiosos: Há preocupações de que a IA possa eventualmente substituir líderes religiosos, como pastores, na preparação de sermões e orientação espiritual. Isso levanta questões sobre o papel dos líderes religiosos e seu impacto nas comunidades de fé.
Falta de Inspiração Divina: Algumas pessoas acreditam que a inspiração divina desempenha um papel fundamental na religião, e a IA não pode replicar essa conexão espiritual. Portanto, a utilização da IA pode ser vista como carente desse aspecto fundamental. Ética e Responsabilidade: A IA pode ser programada com diferentes crenças e valores, o que levanta questões éticas sobre quem controla a IA e como ela é usada em contextos religiosos. Além disso, há preocupações sobre a responsabilidade quando a IA comete erros ou dissemina informações prejudiciais.
Diante disso, surge a pergunta: O que estará regendo nossa vida religiosa, os algoritimos, a IA, ChatGPT ou a espiritualidade centrada no sagrado? Sermões e monografias podem ser produzidas pelas plataformas GPT-3 ou GPT-4, com alto grau de coerência, com citações de autores, bastando que se insira ou faça a pergunta correta. Será que a oração, leitura e estudo da Palavra de Deus tendem a diminuir cada vez mais? Outro desafio é a produção das chamadas fake news que tem causado estragos na sociedade, nas igrejas, faculdades e seminários teológicos.
O fato é que a tecnologia veio para ficar e cada vez mais irá avançar. Teremos que conviver com ela e para isso, precisamos entender e usar a tecnologia como uma aliada e não como uma inimiga ou uma substituta definitiva do agente humano, de princípios e valores de fé e teológicos ou mesmo da capacitação divina. É um aprendizado constante a ser realizado juntamente com o desenvolvimento do caráter.
A tecnologia não é boa ou mal, ela está a nossa disposição, facilita a nossa vida, somos nós que a usamos, portanto, pode ser para o bem ou para o mal. Não podemos demonizá-la, nem sacraliza-la. Os dois extremos estão errados. O mal uso pode nos tornar solitários, pessoas que só se relacionam pela internet. O uso da tecnologia sem reflexão pode nos tirar da oração. Antigamente quando os filhos saiam, os pais oravam, hoje usam o celular e conversam com os filhos e filhas e dispensam a oração. A tecnologia também escancara a desigualdade em nosso país. Enquanto alguns tem acesso a tecnologia de ponta, outros não tem nem a internet.
Uma coisa é certa, a tecnologia não resolve todos os nossos problemas, como se fosse um deus todo poderoso. Só Jesus é poderoso para satisfazer todas as nossas demandas e necessidades. A tecnologia deve ser nossa aliada na pregação da palavra, no ensino do evangelho, no anúncio do reino. Diante da tecnologia cabe a orientação do apóstolo Paulo em colossenses 3,17 - "E tudo o que vocês fizerem ou disserem, façam em nome do Senhor Jesus e por meio dele agradeçam a Deus, o Pai".
[1]Álvaro Machado Dias é neurocientista cognitivo, professor livre-docente da Universidade Federal de São Paulo:https://www.uol.com.br/tilt/colunas/alvaro-machado-dias/2021/01/06/minha-hipotese-sobre-o-futuro-das-religioes.htm
[1] Vestíveis: é um termo geral para um grupo de dispositivos móveis, como relógios(Smartwatches), fones de ouvido, óculos de realidade aumentada e aparelhos para atividades físicas.
Rev. Marcos Nunes da Silva
Diretor da FATIPI
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